domingo, julho 09, 2006

A Vicentina


Logística pronta e muito stress nos entremeios, ruma-se ao Sul. O carro come o asfalto interminável das grandes rectas, a marilú presa no tejadilho queixa-se por melhores dias e as placas da auto-estrada demoram eternidades a dizerem-nos o que queremos ouvir. São azuis, é certo, mas também são francamente entediantes no que concerne à expectativa do destino.
"Sines - 130km » Dá-lhe gás que ainda falta bués."
"Sines - 80 km » Não te estiques que ainda ficas sem prancha."
"Sines - 45 km » Vê lá se a menina não quer ir à casa de banho porque depois na nacional é manhoso."
"Sines - 15 km » Tás quase lá puto, prepara-te para cheirar o mar."
...seriam assim tão mais uteis...

Abre-se o vidro e aquele cheiro inunda-nos os sentidos. A partir deste momento somos levados pelas sensações...toca-nos tudo, o misto de esteva com mata rasteira de duna, a assertoada luta entre os chorões e as camarinheiras, as rochas cheias de personalidade, os arrepios no espírito a cada vislumbre de mais uma falésia perdida, mais um areal inacessível aos menos audaciosos, as aldeias que se instalaram no tempo de à muito tempo atrás e as gentes que sabem que esse tempo nunca passou realmente, a dureza do visual que foi moldado pelos elementos, as côres quentes de tudo, o branco caiado da casa que contrasta com o rebordo azul da suas janelas e portas, o primeiro punhado de luzes que se acende quando o rosado do céu ainda não se entregou de vez à presença das estrelas, o pó que nos lembra que ali há origens, o vento que nos avisa que tudo tem a sua origem, o mar que tudo observa e onde tudo finda e onde eu encontro uma origem.

Mais um pôr-do-Sol dentro de água e eu estou aos gritos sozinho. Voam-me imagens de outros reencontros neste mesmo sítio. Cheguei a um centro. Um eixo. Um prolongamento do que sou em todos grãos de areia desta praia e todas as gotas desta àgua. Um Siddhartianismo se quiserem. Aqui acho sempre respostas. Se tenho a plena consciência que esta costa é a meca para outros tantos loucos das ondas, eu preservo os meus segredos bem guardados quando me perguntam porque não paro de sorrir. Não se explica...sente-se.



- "Sô Dª Maria...sabe o que estou dizendo?"
posted by P.A., 10:55 da tarde

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